TVs de Parintins, AM

Imagem

A pequena cidade de Parintins, no interior do Amazonas, pega fogo no mês de julho. O motivo não é difícil de saber. É nesse período do ano que acontece o famoso Festival de Parintins, onde a disputa entre o Boi Caprichoso e o Boi Garantido transbordam a cidade e invade as águas do Rio Amazonas, um dos mais extensos do mundo com 6.992,06km.

A população de Parintins dobra e se divide entre azul e vermelho. É possível ver latas de Coca-Cola azul, assim como cervejas Brahma e agências do Bradesco. Quem não é azul, é vermelho! Quem não é vermelho, é azul.

Nas ruas, o clima é quente e úmido, típico da região amazônica. No Bumbódromo, local onde as apresentações dos bois acontecem, a temperatura sobe ainda mais. São 2h30 para cada boi mostrar que é melhor do que o outro, durante 3 noites. As filas começam cedo, ainda de manhã.

As ruas em torno do Bumbódromo são tomadas por vendedores ambulantes, viajantes, gringos, manauaras, paraenses e bares improvisados nas garagens e muita cerveja.

Durante esses dias, notei que absolutamente todos os bares da região colocavam suas TVs na rua para atrair a clientela. A TV Cultura transmitia ao vivo todos os detalhes do festival. Lá dentro, a beleza amazônica misturada com pagé, catolicismo e lendas da selva. Lá fora, a ‘galera’ acompanha tudo pelas televisões.

EMI_0832EMI_0834EMI_0837EMI_0844EMI_0857EMI_0870EMI_0880EMI_0896EMI_0900EMI_0912EMI_0954

 

 

Vinho da Serra da Mantiqueira

Imagem

Vinícola Guaspari produz vinhos no interior de S. Paulo, região tradicional de produção de café. O empreendimento tem alguns anos mas desde o ano passado já esta tendo sua safra escoada.  Além disso, a Guaspari faz a colheita no inverno, o que não é comum aqui no Brasil.

Matéria on-line no site da revista Globo Rural. 

 

EMI_0913

EMI_1004

EMI_1087

EMI_1100

EMI_1166

Engenheiros agrônomos  responsáveis pelo vinho na Vinícola Guaspari. À esquerda, o chileno Cristian Sepulveda também é enólogo. Ao seu lado o português Paulo Macedo.

EMI_1293

EMI_1316

EMI_1324

EMI_1328

Corinthians e ACNUR: Time dos Povos

Imagem

O ponto de encontro foi o marco zero da cidade. A Praça da Sé de São Paulo. Ao pouco as famílias e grupos de amigos foram chegando. Muitos falando português com sotaque, outros suas línguas nativas. Árabe e dialetos africanos. Quase todos vestiam camisetas do Corinthians.

Ali começava um dia que para todos ficará gravado na memória graças a uma parceria entre a Caritas Arquidiocesana de São Paulo, a ONU para Refugiados (ACNUR) e o Corinthians. O Projeto Time do Povo dessa vez levou refugiados para conhecer o Parque São Jorge e em seguida assistir um jogo na Arena. Entre eles,  onze crianças entraram em campo com os atletas.

EMI_8079

EMI_8081EMI_8100EMI_8115EMI_8235EMI_8545EMI_8570EMI_8611EMI_8624EMI_8908EMI_8923EMI_9003EMI_9113

Não acreditaram. Mas quem acreditaria?

Logo na entrada da Polícia Federal, no Aeroporto Internacional de Guarulhos, observei um jovem negro vestindo uma camiseta verde e vermelha com ar de desesperado. Pensei que ele pudesse ser parente de alguém preso a alguns metros de onde estavamos.

Despretensioso perguntei de qual time se tratava ela, colorida. Não era de time nenhum. Observei nele um sotaque carregado ao tentar me responder. Falava francês. Era de Conacri, capital da Guiné, um dos países recentemente devastados pelo vírus do ebola. Ele não perdeu ninguém da família.

Abdul, me explicou que seu irmão, ‘Le Petit’, como ele o chama, estava preso no Conector da Polícia Federal há quatro dias e que já tinha precisado de assistência médica. “Ele tem visto brasileiro e reserva em um hotel”. Uma diária em um dormitório nos fundos da zona leste da cidade até ir para Cascavel, no Paraná

*                          *                          *                          *

Enrolando em uma manta para se proteger do frio, ele fica próximo da janela. Ali, alguns livros em francês. Zidane, craque da Copa de 1998 e 2006, dominava uma bola de futebol na capa dura de um deles. A vista da janela é limitada. Tem como paisagem um canto do aeroporto. Só um entre os 14 aqui dentro não é negro.

 Thierno Madjou Bah.

Le Petit

Ao fundo um banheiro feminino e um masculino. Entre eles um bebedouro prateado. Dentro, pendurado nas divisórias de pedra, roupas secavam. O cheiro de suor é quebrado pelo produto de limpeza.

Na frente, perto da porta, alguém tenta pronunciar os nomes árabes dos presos com um marmitex em uma das mãos e uma lista de nome na outra. Pegam, mas não comem. Vem também um suco de caixinha. Para todos é feriado de Ramadã e só se pode comer depois que a luz do dia se vai. Ele são muçulmanos.

Ao lado da porta cobertores coloridos forram o chão. Fotografei ao fingir mandar uma mensagem de texto do celular. Dormem um ao lado do outro, como em um acampamento de adolescentes. Nas cabeceiras, que não existem, agasalhos são usados de travesseiro. Na parede, quase todas as tomadas recarregam aparelhos de celular. O Wi-FI é grátis. Falam com parentes via internet.

*                          *                       *                          *

IMG_0134

Fazendo o caminho inverso daqueles que chegavam do exterior carregados de bagagens, começamos pela esteira de malas, depois passamos pela verificação de passaportes até quase as salas de embarque. Contei mais de cinco placas indicando que estávamos na contramão do fluxo.

A repórter Fabíola Perez, eu, o assessor de imprensa e mais uma delegada. Eles todos com distintivos da PF aparente. Sorridentes e prestativos. Estavam acompanhando jornalistas.

Bloquinho nas mãos e celular no bolso, franzi a testa parecendo sério ao apetar a mão de todos. Caminhamos por 15 minutos até chegarmos em uma sala abafada onde, na porta, funcionários conversavam e mexiam no celular. Era expressamente proibido fotografar lá dentro.

Em um ambiente de piso frio de pedra, todos os olhares voltam para nós. Me senti entrando em um zoológico. O cheiro de suor era forte. O assessor fez um sinal querendo dizer, ‘venham, eles estão aqui. Olhem só’. Meio constrangidos, perguntamos pelo Le Petit. Tínhamos o nome dele completo.

Enrolando em uma manta para se proteger do frio e de cabeça meio baixa ele saiu de perto da janela e chegou próximo de nós. Nos apresentamos. Conversamos. Ele tinha tentado entrar como turista e foi colocado na sala fria. Não acreditaram. Mas quem acreditaria?

Durante nossa conversa, mesmo que rápida, ele foi ganhando confiança. Segurava o tempo todo um algodão contra a veia do braço esquerdo, como se tivesse acabado de tirar sangue.

Fomos interrompidos por um funcionário com um copo descartável de água e uma aspirina. Foram para perto da janela. Ele tomou o remédio. Eu fotografei. Ninguém notou. “Estou com dor de barriga e no coração”, justificou Le Petit.

IMG_0126

Formado em sociologia estagiava no Banque Islamique de Guinée. Depois da epidemia de ebola as coisas ficaram difíceis. Ninguém mais queria ter contato físico com ninguém. Resolveu vir atrás do irmão. “Tenho emprego garantido no Paraná”.

Desde 1997 qualquer imigrante que chegue no Brasil, mesmo que sem documentos, poderá ser acolhido de acordo com a Lei do Refúgio.

 Thierno Madjou Bah.

Le Petit

No começo da conversa ‘Le Petit’ insistia que vinha visitar o irmão. Mais adiante, tive a oportunidade de lhe falar sobre a lei. Ele abriu um sorriso branco que contrastava com sua pele negra. Baixinho, pouco mais de 1,60m, me olhou discretamente de baixo para cima. Senti que ele ganhou esperanças. “Não estou doente”, falou baixo. “Percebi”, respondi.

Combinamos que, na entrevista com o delegado, ele falaria que era refugiado. Que ainda fugia do ebola. Ele sorriu. Topou. Era terça-feira, 23 de junho de 2015. Ele não sabia quando chegaria essa hora. O que estava há mais tempo preso, completava 7 dias. Ele apenas 4.

Fomos conversando para perto da janela e falei para Le Petit e um outro jovem que estava fotografando-os. Ambos concordaram e me ajudaram na discrição. Fotografei-os.

IMG_0147

Alguns minutos depois, eu e Fabíola tivemos que sair da sala. Deu o tempo. Dessa vez fizemos o caminho na mão correta, como qualquer viajante faz. Barreira da PF, DutyFree, esteira de malas, desembarque. Só não tínhamos passaportes nas mãos, nem roupas nas malas.

Exata uma semana depois, ouço um barulho vindo do meu computador. Relutei em abrir. O nome completo de Le Petit piscava na tela. Atendi meio disperso. Estava concentrado em outra coisa. Era terça-feira, dia 30 de junho.

“Estou livre no Brasil. Meu irmão está vindo no aeroporto me buscar”. Me desconcentrei do que estava fazendo. Meus olhos encheram d’água. “Ganhamos”, brincou.

*                          *                          *                          *

Hoje, terça-feira, dia 07 de julho, 22h30. Acabo de receber uma ligação do Le Petit via facebook. Eu tinha acabado de escrever esse texto. Ele me conta que pela primeira vez foi ao centro da cidade e que está feliz em São Paulo.

Amanhã cedo eles tomarão rumos diferentes. Seu irmão, Abdul, que vestia vermelho e verde naquela terça-feira, parte em viagem. De ônibus, junto com um grupo de amigos, ruma sentido Equador.“Ele vai tentar os Estados Unidos”.

Le Petit deverá finalmente ir para Cumbica recuperar sua bagagem que estava detida desde sua chegada.

IMG_0151

GRU

14º dia: BR163, uma rodovia longitudinal

Nossa próxima parada seria dali a 154km, segundo o Google. Em 2h09 estaríamos em Novo Progresso, sempre pela BR163 sentido Santarém. Pena que o ‘sabe tudo’ da internet sabe pouco sobre estradas federais. Inocente. A ligação entre nossa partida e nosso destino tinha uma variedade inumerável de buracos, para todos os gostos: pequenos, grandes, gordos, magros, fundos, rasos. Na direita, na esquerda, no meio. Com fundo de terra, cheio d’água, com lama, seco. Falo do asfalto. A parte de terra tem erosões fundas, rasas, perigosas, inofensivas. Barrancos caídos, cascalho solto e, em alguns momentos, materiais de construção de concessionárias que deveriam fazer a pavimentação da estrada, mas largaram mão. Essa é a BR163, uma das principais rotas de escoamento de soja do Brasil.

EMI_6723

A BR-163 é uma rodovia longitudinal, ou seja, ela corta o país do sentido norte-sul. Ao lado da BR174, elas são uma exceção, têm seus quilômetros contados a partir do sul e não do norte, como todas as outras rodovias nacionais. Iniciando em Tenente Portela no Rio Grande do Sul ela termina em Santarém, no Pará, com total de 3467 km de extensão, sendo quase 1000 km não asfaltados.

map-br-163

Além de buracos, outra coisa nos fazia rir. Até de uma maneira irônica. Placas que nos informavam da má qualidade da estrada e pedia para reduzirmos a velocidade. “Pista escorregadia” ou “Cuidado com buracos”. Era mesmo necessário esse tipo de informação óbvia?

EMI_6727 EMI_6730 EMI_6726 EMI_6719 EMI_6722 EMI_6725

Viajo muito pela rodovia Fernão Dias, BR381, que liga São Paulo a Belo Horizonte, MG. Me lembro muito bem de uma coisa que me assustava, ainda pequeno: quando estrada ainda não era duplicada haviam muitas cruzes na beira do asfalto. Cruzes de madeira, coloridas e as vezes até uma pequena igrejinha. Nunca imaginei que elas eram homenagens às pessoas mortas ali. Detalhe um pouco assustador, mas enfim, era a realidade de uma estrada federal que morria gente toda a semana. Já eu, adorava ver caminhões tombados.

Quando me deparei com essa pequena capela na beira do chão batido voltei pelo menos uma década nas minhas recordações e saquei na hora. Ali, naquela curva fechada, que terminava de cara para um barranco, morreu alguém. Aliás, ela se parecia mais um pequeno túmulo do que qualquer outra coisa. Notei que a capela era toda feita de piso branco e que dentro dela, fechada com um pequeno cadeado dourado, tinha um santo. Me chamou a atenção como ela estava limpa naquela poeira toda. O repórter não entendeu o que fazia uma ‘mini igreja’ onde quase ninguém parava e eu expliquei o motivo. A boleia do nosso caminhão ficou em silêncio. Motorista e repórter fizeram o sinal da cruz e bola para frente.

EMI_6721

De volta ao asfalto.

EMI_6731

Pouco tempo depois chegamos em Novo Progresso. De progresso, pelo menos da entrada da cidade, não tem nada.

EMI_6736

Ainda de tarde fomos entrevistar alguns gerentes de transportadoras da região, conhecemos os pontos de apoio das empresas e fizemos alguns vídeos.

EMI_6827EMI_6763

EMI_6758

Mais a noite saímos para jantar. Na volta pegamos um táxi e perguntei ao motorista sobre a noitada da cidade, que me parecia animada naquela hora. Ele me disse que o melhor lugar era o boteco Bate Papo, ‘logo ali, te faço a R$ 15,00 a corrida’. Agradeci, falei que no dia seguinte acordaria cedo e perguntei se ele iria. Enquanto esperávamos repórter e motorista sacarem dinheiro ele me mostrou no seu whatsapp suas amigas e como a noite naquela cidade era animada. Na lista só tinham mulheres. Loiras, morenas, gordas, magrelas, mostrando a língua na frente do espelho. Vi uma por uma. Perguntei: e o senhor, tem namorada? “Minha mulher me largou faz pouco tempo. Estava casado e engravidei uma outra”.